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Foto do escritorHage Advogados Associados

Uma governadora em apuros: a barbárie nas prisões do Maranhão

Em dezembro último, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) entregou ao presidente do STF e ao procurador-geral da República um relatório que conclui que as unidades prisionais do Maranhão estão superlotadas e sem condições mínimas para manter a integridade física dos presos e seus familiares.


Contudo, é o cenário de barbárie que o documento traz em seu interior – e não a letra fria de sua conclusão – que escandaliza.


Segundo o documento, o Complexo Penitenciário de Pedrinhas, em São Luis, é dominado por duas facções criminosas rivais, que deixam as unidades prisionais extremamente violentas, obrigando presos a prostituírem suas próprias esposas e filhas, torturando desafetos e sentenciando a morte aqueles que não aderem à lei do presídio.


E, no início desta semana, a Folha de São Paulo veiculou um vídeo de pouco mais de 2 minutos, com imediata repercussão (inclusive, internacional), que mostra cenas fortíssimas, retratando a selvageria vivida dentro da unidade penal.


Só que a governadora Roseana Sarney (PMDB), preferiu, para espanto geral, condenar a veiculação do vídeo em si, rotulando de “repudiante” (sic) a divulgação das imagens, pois – segundo ela – “só corrobora com uma ação no mínimo criminosa, com apelo sensacionalista e que fere todos os preceitos dos direitos humanos e as leis de proteção ao cidadão e à família [dos detentos mortos], que se vê novamente diante de uma exposição brutal”.


Na verdade, culpar a janela pela feiúra da paisagem tem sido a tônica do governo maranhense.


No inicio do mês, a Secretaria de Comunicação do Estado já havia divulgado nota em que criticava o relatório do CNJ, acusando de serem “inverdades as informações que foram levadas a público”, e que o documento teria o “objetivo de agravar ainda mais a situação nas unidades prisionais, numa clara tentativa de descredibilizar medidas que já haviam sido determinadas pelo governo”.


Até mesmo o senador José Sarney (PMDB), demonstrando absoluto nonsense, resolveu palpitar sobre o cenário caótico, festejando (por incrível que pareça) o fato de que pelo menos no “Maranhão, nós conseguimos que a violência não a saísse dos presídios para a rua”, “nós temos conseguido que aqui essa coisa não extrapole para a própria sociedade”. Como se os presos e seus familiares não fizessem parte da sociedade.


Contudo, nem mais isso o senador pode “comemorar”. A barbárie da prisão já tomou as ruas de São Luiz. Em 03/01, os presos de Pedrinhas ordenaram ataques a quatro ônibus, que resultaram na morte de uma criança de seis anos.


Como os fatos não mentem e falam por si só, o governo maranhense recuou da iniciativa inicial de tentar desacreditar o CNJ, e, finalmente, resolveu se mover para tentar retomar o controle do sistema prisional do estado.


Primeiro, o Estado impôs medidas mais duras no sistema prisional. O batalhão de choque da Policia Militar assumiu o Complexo Penitenciário de Pedrinhas e, com mãos de ferro, administra um “regime de quartel”, com revistas de celas até três vezes por dia e visitas restritíssimas.


A governadora também aceitou auxílio do governo federal, que assumindo sua cota de responsabilidade no caos, enviou homens da Força Nacional para reforçar a segurança no estado e prepara a remoção de presos para penitenciarias federais, bem como mutirão das defensorias públicas para avaliar a situação de todos os presos.


Embora necessárias, essas medidas são meramente paliativas. A transferência de presos e a intervenção da PM não resolvem o problema central, que é de estrutura, cujo gargalo é a falta de investimento em pessoal qualificado, em equipamentos de segurança e na construção de novos presídios.


Apesar da governadora já ter demonstrado irritação com as críticas a sua família, é mais que a correta a vinculação que a imprensa tem feito entre o caos instalado no Estado e os desmandos dos Sarneys, que estão no poder desde 1966.


A cada responsável deve ser impingida sim sua parcela de culpa pela violência nos presídios maranhenses. A família Sarney, que deixa como legado índices terríveis de desenvolvimento humano. Aos presidentes da República, que jamais demonstraram comprometimento com a questão prisional. Ao Estado brasileiro, que foge da responsabilidade de zelar pela integridade dos presos. Aos operadores do direito por preterirem penas alternativas. E até mesmo a sociedade, que, ao considerar a questão de segunda ordem, é conivente e contribui na criação desses monstros.


Dib Kfouri Neto

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